sábado, 3 de maio de 2025

9. O PAVÃO E O SAPO (Adendo a "Antropoceno...")

 



O PAVÃO E O SAPO


Existiu, certa vez, um lindo pavão, de penas coloridas e andar gracioso. De todos os pavões ele era o de plumagem mais vistosa e delicada, e dentre todos os animais era ele o mais soberbo. Não havia na floresta animal que ao vê-lo não dissesse, "como é magnífico o Pavão", e sorrisse por ele. Contudo, apesar de belo e admirado, o Pavão vivia triste.

Não entendiam os outros bichos o porquê disso: o Pavão era triste, e era triste porque parecia ser o único a não enxergar sua própria beleza. Vivia cabisbaixo, com olhares perdidos, aos supiros, e sempre lamentando-se de sua pouca sorte aos outros animais. "Ai de mim, Dona Pata!", "Como sou desgraçado, Seu Castor!", "Ó tristeza, Dona Borboleta!", "Como sou desajeitado e como são pobres as minhas plumas!". E ouvindo isso todos os outros animais se penalizavam dele, e tentavam convencê-lo do contrário. E sempre o Pavão estava rodeado de outros bichos, que a todo instante lembravam-no da beleza de suas cores e da elegância do seu andar.

Assim, seguiam as coisas na floresta. E a todos o belo e triste pavão ouvia, descrente e humilde.

Numa manhã, passeava o Pavão pela floresta, acompanhado, como de costume, por um punhado de outros animaizinhos, que prestativos, dedicavam-se a tarefa de exaltar quase em coro, as virtudes do Pavão, que os escutava com ares invariavelmente tristes.

Ao passarem próximos a um lago, o Sapo avistou a cena, e ouviu-o dizer as mesmas queixas costumeiras aos que o seguiam: "Agradeço-lhes as    palavras generosas, mas não vejo onde possam encontrar beleza alguma em mim. Minhas penas não são vistosas e meu andar é por demais desengonçado e patético! Como sou triste, amigos!!"

E o Sapo que era sincero e estava aborrecido com tanta insistência por respostas, observou melhor o Pavão, e acostumado a estética dos lamaçais e pântanos, não encontrou graça alguma nele. Desta forma,    concordando com aquelas palavras, pronunciou-se tranquilo: "De fato, estou de acordo contigo, Pavão. Todas as manhãs contemplo os inúmeros bichos que aqui vem beber neste lago e, aos meus olhos, não és tão belo quanto alegam esses que aí te acompanham. Para mim, por exemplo, nada é tão lindo quanto as cores da Salamandra ou as pupilas fendidas e terríveis do Sr. Jacaré. Compreendo esses teus ais". E após ter dito isto, virou-se despreocupado e pulou de volta à água.

Nesse momento todos os bichos se entreolharam surpresos. A Pata se escandalizou. A Libélula não quis acreditar no que ouviu e pediu confirmação à Abelha, que zumbiu confirmando o aparente absurdo. Assim, voltando-se todos preocupados para o Pavão, encontraram-no fitando apático as águas do lago. Nisso, rompendo o silêncio, o Pavão exclamou furioso: "Oras, e o que entende de beleza um sapo!?".

E depois disso, o Pavão, que amava admirar seu próprio reflexo nas margens dos lagos, passou a evitá-los.

“Os Sapos os sujam”, dizia aos outros animais. O Sapo, ao saber disso, comentava sem ligar importância: “Deve ser por isso que as lagoas agora andam tão mais silenciosas”.


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